Especialistas não concordam com a classificação da Venezuela como narcoestado, como afirma Trump.

Acusações dos EUA e o Debate sobre o Narcoestado

Em meio a acusações dos Estados Unidos de que o governo venezuelano lidera um cartel de drogas para justificar ameaças militares contra o país sul-americano, especialistas entrevistados pela Agência Brasil contestam a classificação da Venezuela como um narcoestado.

Exame Crítico do Termo Narcoestado

Para a consultora sênior da União Europeia para Políticas sobre Drogas na América Latina e Caribe, Gabriela de Luca, o uso do termo é exagerado e impreciso. Ela afirma que, com base em investigações sérias, existem militares e autoridades envolvidos em esquemas de tráfico, principalmente em áreas de fronteira, mas não há provas de uma estrutura centralizada que coloque o Estado a serviço do narcotráfico.

Na semana passada, durante visita ao Paraguai, o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, declarou que o governo da Venezuela “é um grupo que está operando em águas internacionais simplesmente exportando para os EUA veneno, que está matando e destruindo a comunidade”. Ele afirmou ainda que o Cartel de los Soles é uma das organizações mais amplas do continente, classificando o regime de Maduro como uma organização criminosa.

Estruturas Criminosas

Gabriela de Luca também considera enganoso classificar o Cartel de los Soles como um cartel de drogas típico, similar aos mexicanos, como o Sinaloa. Ela destaca que existem redes difusas, envolvendo militares, ex-militares e alguns políticos, que facilitam o tráfico em determinadas regiões. A participação de autoridades estatais com o narcotráfico é reconhecida, mas não em uma estrutura única dirigida por Maduro.

O ex-oficial nacional de Inteligência dos EUA, Fulton Armstrong, levantou dúvidas sobre as primeiras denúncias contra Maduro em 2020, afirmando que a maioria das drogas nunca passou pela Venezuela. Ele enfatiza que os documentos de indiciamentos contra o governo Maduro não têm respaldo entre analistas sérios.

Relação dos EUA com o Narcotráfico

Dona das maiores reservas de petróleo do mundo, a Venezuela mantém uma relação de atrito com os EUA desde a chegada dos chavistas ao poder. As novas ameaças do governo Trump aumentaram as tensões na América Latina, pois há riscos de uma intervenção direta dos EUA na região, semelhante à invasão do Panamá em 1989, quando alegações de envolvimento com narcotraficantes foram usadas como justificativa.

Narcoestado e Criminalidade

O coronel da reserva da Polícia Militar do Rio de Janeiro, Robson Rodrigues, doutor em ciências sociais, concorda que o grupo de Los Soles não possui o protagonismo afirmado pelos EUA. Ele sugere que as atividades criminosas são superestimadas e critica a estratégia militar dos EUA de enviar navios de guerra, defendendo um trabalho de inteligência mais eficaz em parceria com os Estados da região.

Rodrigues observou que o envolvimento de autoridades com o narcotráfico é registrado em diversos países, incluindo os EUA. Ele citou o envolvimento do Departamento de Estado e da CIA com narcóticos, conforme discutido em um novo livro do repórter investigativo Seth Harp.

Denúncias dos EUA

A acusação de que a elite do governo venezuelano estaria envolvida com o narcotráfico foi feita pela primeira vez durante o primeiro mandato do presidente Donald Trump, em 2020, no contexto da “máxima pressão” para derrubar o governo Maduro.

Em 2019, o então deputado Juan Guaidó se autoproclamou presidente da Venezuela e buscou dividir as Forças Armadas Bolivarianas. O procurador-geral dos EUA da época, William P. Barr, afirmou que Maduro e seus assessores conspiraram com guerrilhas colombianas para comercializar cocaína.

No início deste mês, a atual fiscal geral dos EUA, Pamela Bondi, anunciou o aumento da recompensa por informações que levem à prisão de Maduro para US$ 50 milhões. Ela denunciou Maduro como um dos maiores narcotraficantes do mundo, ligando-o a diversas organizações criminosas, incluindo o Tren de Aragua e o Cartel de Sinaloa.

Mercado de Drogas

O centro de pesquisa Washington Office on Latin America (WOLA), que reúne especialistas críticos ao governo Maduro, avaliou que o papel da Venezuela no comércio mundial de drogas é exagerado. O relatório destaca que, embora o crime organizado e a corrupção tenham aumentado na Venezuela, a escala do tráfico transnacional é frequentemente exagerada.

A WOLA também afirmou que as alegações de um “narcoestado” na Venezuela são usadas por alguns políticos para resistir a uma solução negociada para o conflito no país. A consultora Gabriela de Luca acrescentou que a Venezuela não é uma produtora significativa de cocaína, mas sim uma rota de passagem.

O Relatório Mundial sobre Drogas de 2025 da Agência das Nações Unidas para Drogas e Crime (UNODC) reiterou que os principais fluxos de tráfico de cocaína vêm de países andinos, citando Colômbia, Bolívia e Peru, sem mencionar a Venezuela. A União Europeia também não listou a Venezuela como relevante no mercado global.

Cooperação e Intervenção

Autoridades latino-americanas criticam as declarações do governo Trump sobre possível interferência na América Latina. A presidenta do México, Claudia Sheinbaum, expressou que a cooperação é possível, mas sem interferência externa, posição corroborada por Colômbia e Brasil.

Durante uma reunião com o presidente do Equador, Daniel Noboa, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, argumentou que o combate às drogas não justifica intervenção externa. Lula defendeu que para deter as redes criminosas da América do Sul, a ação conjunta é fundamental, sem a necessidade de classificar organizações criminosas como terroristas.

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