Opções de investimentos surgem como alternativa ao endividamento de R$ 2,8 bilhões do Flamengo para construir estádio.

O Cenário Atual da Renda Fixa

Com a taxa Selic estabelecida em 15% ao ano, o contexto financeiro atual favorece investimentos em renda fixa, principalmente em ativos pós-fixados. Estes incluem aplicações que estão atreladas ao Certificado de Depósito Interbancário (CDI), que é a principal referência de rendimento para os investimentos, ou diretamente à taxa básica de juros. Tais opções garantem maior liquidez e ajudam na preservação do caixa no curto e médio prazo.

Se o Flamengo tivesse disponível a quantia de R$ 2,8 bilhões e decidisse aplicar esse valor em produtos de renda fixa, o retorno anual bruto estimado poderia chegar a aproximadamente R$ 420 milhões, segundo Gustavo Guimarães, especialista em renda fixa da Manchester Investimentos. Após a dedução dos impostos, o rendimento líquido ficaria em torno de R$ 330 milhões.

Esse montante, conforme analisado por Guimarães, poderia gerar uma nova receita recorrente equivalente à atual geração operacional do clube, que foi de R$ 712 milhões no primeiro semestre. O especialista menciona que a renda financeira poderia atuar como um colchão, proporcionando um equilíbrio nas finanças do clube enquanto o projeto do novo estádio está em desenvolvimento.

Willian May, sócio da JGP Financial Advisory, acrescenta que esse rendimento seria capaz de cobrir quase integralmente a folha salarial do Flamengo, que atualmente está em torno de R$ 40 milhões mensais. No entanto, ele observa que a utilização desse capital como fonte de renda passiva implica um efeito de desvalorização do capital devido à inflação.

Alternativas de Investimento Além da Renda Fixa

Felipe Pontes, gestor de patrimônio e sócio da AvantGarde Asset Management, concorda que a renda fixa oferece um fluxo de caixa previsível. Contudo, ele sugere que o Flamengo poderia explorar uma segunda linha de investimento que incorpore um pouco mais de risco. Pontes menciona a possibilidade de atuar no setor de private equity, focando em empresas que ainda não estão listadas em bolsas de valores, especialmente aquelas ligadas ao esporte e ao entretenimento.

“A ideia seria que o Flamengo se tornasse sócio de startups ou de companhias de tecnologia que operam no universo esportivo, contribuindo para a criação de novas fontes de receita e inovação que não dependem estritamente do desempenho dentro de campo”, diz.

Em adição, o clube poderia também considerar investimentos voltados à internacionalização de sua marca. Pontes destaca que a expansão da presença global poderia ser realizada através de academias oficiais no exterior, parcerias estratégicas de mídia e licenciamento de produtos, o que fortaleceria a marca em um cenário internacional e poderia ampliar significativamente o faturamento do clube no longo prazo.

Willian May, da JGP, sugere ainda que o Flamengo poderia focar em melhorar seu centro de treinamento e expandir sua base de atletas. Segundo ele, esses investimentos a longo prazo poderiam facilitar a revelação de talentos, aumentar o fluxo recorrente com a venda de atletas e minimizar gastos com grandes contratações. “Craques o Flamengo faz em casa”, ressalta.

Enquanto isso, Daniel Nigri, analista de ações da Research Dica de Hoje, argumenta que, com o CDI em 15% ao ano, o ambiente atual não é favorável para projetos que envolvam maior grau de risco. Ele explica que, antes de qualquer decisão sobre a construção de um novo estádio ou outro grande investimento, o clube rubro-negro deve calcular a Taxa Interna de Retorno (TIR) do projeto.

Essa TIR precisa ser superior à taxa mínima de atratividade, que combina o custo de captação com um prêmio de risco. “Considerando o CDI em 15%, somado a 3% de custo de captação e 5% de risco, o clube só deve iniciar um projeto caso ele mostre potencial para entregar ao menos 23% ao ano, o que corresponde a cerca de R$ 630 milhões anuais sobre os R$ 2,8 bilhões”, explica Nigri. Ele defende que, enquanto os juros se mantiverem altos, grandes projetos tendem a não serem viáveis.

Viabilidade do Financiamento do Estádio

Passando para a realidade de que o Flamengo não possui a quantia necessária, surge a questão de se o endividamento para financiar a construção do estádio seria uma alternativa viável. Daniel Nigri ressalta que essa opção envolve riscos elevados.

Ele observa que, apesar de que os primeiros 18 a 30 meses do projeto exigiriam pouco desembolso financeiro, os custos aumentam rapidamente durante a fase de execução. “Com o CDI a 15%, se o clube captasse os R$ 2,8 bilhões, a despesa financeira ficaria em cerca de R$ 420 milhões por ano apenas em juros, sem incluir a amortização da dívida”, calcula.

Esse valor representaria aproximadamente 35% do faturamento anual do Flamengo, que totalizou R$ 1,2 bilhão no último ano. O grande desafio, conforme destacado por Nigri, é que as novas receitas geradas pelo estádio só começariam a ser percebidas após a conclusão da obra, o que cria um período crítico de desequilíbrio financeiro.

Felipe Pontes também concorda que o peso do endividamento traz riscos significativos para o clube carioca. “O serviço da dívida consumiria recursos que poderiam ser direcionados a contratações e salários, diminuindo a competitividade do elenco e, consequentemente, a geração de receitas futuras”, alerta.

Pontes lembra que o Corinthians, com sua Arena Itaquera, acabou se prendendo a uma dívida bilionária com condições duras de pagamento, o que limitou significativamente os investimentos em sua equipe por um longo período.

Willian May afirma que, para enfrentar um financiamento desse porte, o Flamengo precisaria desenvolver uma estrutura de financiamento meticulosamente elaborada, incluindo garantias, períodos de carência, prazos longos e, eventualmente, a participação de parceiros privados ou capital incentivado.

Em linhas gerais, uma dívida dessa magnitude comprometeria uma parte considerável do fluxo de caixa do Flamengo, aumentando a dependência de receitas variáveis, como bilheteira, sócio-torcedor, venda de atletas e premiações. “Isso geraria riscos de desequilíbrio financeiro e impactaria a capacidade de construção do elenco, já que a maior parte do fluxo de caixa estaria comprometida com o serviço da dívida”, conclui o sócio da JGP.

Impacto das Decisões Financeiras

No final, a decisão do Flamengo precisa ponderar entre retorno, risco e estratégia. Felipe Pontes, da AvantGarde, enfatiza que o mercado financeiro oferece retorno imediato e previsível, além de liquidez, uma vez que o clube pode resgatar os recursos a qualquer momento. Em contrapartida, a construção de um estádio se configura como um ativo ilíquido, que promete um retorno mais alto, porém a longo prazo, e com elevado grau de risco.

“Além do impacto financeiro, a construção de um estádio fortalece a identidade do clube e tem o potencial de triplicar as receitas provenientes de jogos e eventos, como ocorreu com o Bayern de Munique na Allianz Arena”, destaca Pontes.

Gustavo Guimarães, da Manchester, ressalta que projetos de tal magnitude são mais adequados em períodos de juros baixos. No cenário atual, a recomendação é que o Flamengo mantenha seus recursos aplicados, com o objetivo de multiplicar receitas recorrentes. “A escolha do Flamengo deve equilibrar a sustentabilidade financeira no curto prazo com uma visão estratégica que se estenda ao longo do tempo”, finaliza Willian May, da JGP.

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