Concorrência europeia se une contra a SpaceX
Impulsionadas ao limite pela SpaceX, liderada por Elon Musk, as principais empresas de satélites da Europa estão superando rivalidades históricas em uma fusão avaliada em 7 bilhões de dólares. Este movimento tem sido descrito como uma “aposta de vida ou morte,” e já ganhou o apelido interno de “Projeto FOMO” (sigla em inglês para “fear of missing out”, ou “medo de ficar de fora”).
Contexto da fusão
O nome “Projeto FOMO” é uma referência ao “Projeto Bromo”, que era o codinome das negociações que culminaram no acordo anunciado recentemente entre Airbus, Thales e Leonardo. O novo apelido evidencia o receio de perder espaço em um mercado dominado pela SpaceX e pela sua constelação Starlink, além das novas mega-constelações que estão sendo desenvolvidas na China.
“Uma fusão desse tipo entre as três maiores empresas espaciais europeias seria impensável há dez anos. No entanto, atualmente, a competição entre Airbus e Thales é muito menos relevante do que a disputa entre Europa, Estados Unidos e China,” afirmou Caleb Henry, diretor de pesquisa da consultoria Quilty Space.
União para competir globalmente
A fusão junta duas joint ventures entre Thales e Leonardo — Thales Alenia Space e Telespazio — com a divisão de satélites da Airbus, além de várias outras atividades menores. Anteriormente, Airbus e Thales haviam considerado a possibilidade de uma parceria, mas também enfrentaram resistência da Comissão Europeia e a urgência política e industrial para um acordo era reduzida, conforme indicado por fontes envolvidas nas discussões.
Desde a última tentativa, que ocorreu há mais de cinco anos, o mercado europeu tradicional de satélites geoestacionários sofreu uma queda de 50%, devido à inundação de satélites mais acessíveis em órbitas baixas. A invasão da Ucrânia pela Rússia e a resultante insegurança nas relações com os Estados Unidos aceleraram os esforços da Europa para proteger ativos sensíveis, como satélites, que se entrelaçam cada vez mais com o setor de defesa.
O ponto crítico dessa situação surgiu a partir das crescentes perdas enfrentadas em satélites reprogramáveis de última geração, como o programa OneSat da Airbus. Em 2024, o CEO da Airbus, Guillaume Faury, que foi incumbido de reformar a estratégia de defesa e espaço da empresa, expressou internamente a necessidade de ações, alertando que as perdas eram “inaceitáveis”.
Negociações difíceis
No meio de 2024, a Airbus se deparava com crescentes encargos, particularmente relacionados ao programa OneSat, enquanto a Thales lidava com excesso de capacidade produtiva. Esses fatores impulsionaram as empresas a se engajar nas negociações que foram inicialmente relatadas pelo jornal La Tribune. Uma fonte com conhecimento direto da situação, que pediu para permanecer anônima, afirmou que a Airbus, junto às joint ventures de satélites controladas por Thales e Leonardo, reconheceu que estavam enfrentando dificuldades e que precisavam competir globalmente, em vez de entre si.
Outra fonte envolvida nas negociações acrescentou que havia um “consenso predominante” sobre a necessidade absoluta dessa fusão. Essa nova postura pragmática foi crucial para amenizar as tensões políticas que frequentemente surgem no setor aeroespacial europeu, embora não tenha eliminado completamente as negociações complexas relacionadas às avaliações das empresas, de acordo com pessoas próximas ao processo.
“Desta vez, prevaleceu a lógica de que era ‘fazer ou morrer’,” comentou uma pessoa próxima às negociações à Reuters.
Por outro lado, a indústria de defesa europeia ainda fragmentada continua a ter dificuldades em coordenar uma resposta eficaz às ameaças cada vez mais prementes. O setor europeu de lançamentos espaciais está ainda mais dividido, pois a Itália se afastou da Arianespace, operadora em parte controlada pela Airbus e responsável pelos foguetes Ariane. A integração entre os foguetes, satélites e serviços como o Starlink, da SpaceX, é considerada crucial para a redução de custos; no entanto, a nova fusão europeia não inclui veículos de lançamento.
Alguns analistas expressam preocupações de que essa colaboração não será suficiente para reverter os efeitos de anos de indecisão que deixaram a Europa em uma posição desvantajosa, especialmente em um momento em que o continente tenta construir sua nova rede de satélites seguros, conhecida como IRIS².
“Acredito que seja tarde demais. A empresa deverá dedicar-se à consolidação por pelo menos dois anos, período em que também precisará projetar o IRIS²,” observou o consultor de satélites Christian von der Ropp.
Conflitos regulatórios à vista
O CEO da fabricante alemã de satélites OHB deu início a um possível conflito regulatório ao declarar ao jornal Börsen-Zeitung que esta fusão representa “uma ameaça para nós”. O acordo pode prejudicar a colaboração em licitações de contratos entre a OHB e a Thales, de acordo com uma fonte sênior. Para garantir apoio, as empresas envolvidas na fusão estão instando as autoridades de concorrência europeias a adotar uma perspectiva mais abrangente ao avaliar a concentração de mercado, alegando que o setor espacial deve ser considerado como um mercado global, conforme afirmam três pessoas próximas às negociações.
Além disso, elas argumentam que o acordo irá reforçar a soberania europeia. No entanto, o pacto levanta preocupações sobre a capacidade produtiva, uma vez que a Europa busca aumentar sua participação em mercados em crescimento e evitar novos cortes de empregos, além dos 3 mil já anunciados para 2024. “Não acredito que a capacidade deva ser reduzida. É fundamental preservá-la, pois será necessária”, comentou o analista da Agency Partners, Nick Cunningham.
As empresas também optaram por adiar discussões mais delicadas sobre governança, afirmando apenas que a estrutura será “equilibrada.” Segundo analistas do setor, a maneira como o poder será compartilhado na prática será um fator determinante para o sucesso dessa fusão tripla, que está prevista para ser concluída entre agora e 2027.
Fonte: www.moneytimes.com.br
