O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) na COP30 e a regulamentação da Lei de PSA.

O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) na COP30 e a regulamentação da Lei de PSA.

by Ricardo Almeida
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Fundo Florestas Tropicais para Sempre

O Brasil pretende lançar na COP30, que ocorrerá em Belém, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês Tropical Forest Forever Facility). Esta iniciativa foi criada com o objetivo de remunerar países tropicais que mantêm suas florestas preservadas.

O TFFF tem potencial para se tornar um dos mecanismos mais inovadores da agenda climática recente, ao estabelecer um fluxo previsível de recursos internacionais voltados para a conservação ambiental.

Arquitetura Financeira

O fundo será estruturado com uma arquitetura financeira híbrida. A primeira parte do recurso, estimada em US$ 25 bilhões, será proveniente de fundos soberanos, governos e doações filantrópicas, funcionando como capital concessional. Esse colchão de risco visa atrair investidores institucionais que, através da emissão de títulos de dívida, irão investir a maior parte dos recursos. A meta é atingir um total de US$ 125 bilhões aplicados em ativos conservadores, incluindo títulos soberanos e green bonds.

Os rendimentos gerados por esses investimentos serão, inicialmente, utilizados para pagar os credores. Apenas o excedente líquido será redistribuído entre os países tropicais que se qualificarem, baseando-se em um valor de referência de US$ 4 por hectare de floresta tropical conservada.

Com isso, estima-se que o Brasil possa receber até R$ 6 bilhões anualmente, dada sua vasta extensão florestal na Amazônia e na Mata Atlântica.

Critérios de Participação e Penalidades

Para que os países possam participar do TFFF, eles precisarão demonstrar que a taxa de desmatamento está abaixo da média global, que gira em torno de 0,5% ao ano, além de uma gestão transparente dos recursos recebidos. O modelo prevê penalidades rigorosas: cada hectare desmatado pode acarretar um desconto de até 200 vezes sobre o valor pago por hectare preservado, enquanto áreas afetadas por incêndios florestais resultarão em um desconto de 25 vezes.

O monitoramento da preservação das florestas será realizado por meio de tecnologia de satélite, em um modelo semelhante ao Prodes/Inpe, permitindo a verificação anual da área de floresta em pé. A proposta ainda inclui a obrigação de destinar pelo menos 20% dos repasses a povos indígenas e comunidades locais, reconhecendo a importância desses grupos na proteção dos ecossistemas.

Relação com a Lei de Pagamento por Serviços Ambientais

No Brasil, a entrada de recursos provenientes do TFFF deverá se fundamentar na Lei nº 14.119/2021, que institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA). Esta legislação já prevê a utilização de recursos públicos e privados, tanto nacionais quanto internacionais, para recompensar serviços ambientais, como a conservação da vegetação nativa e a recuperação de áreas degradadas.

Essa estrutura significa que os repasses do TFFF poderão ser operacionalizados como um sistema de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) em larga escala, com transferências não reembolsáveis a produtores rurais, povos indígenas, comunidades locais e outros responsáveis pela conservação ambiental.

A regulamentação da lei será crucial para assegurar segurança jurídica, definindo se os recursos se integrarão ao orçamento da União, tornando-se sujeitos ao controle fiscal, ou se serão geridos por um fundo fiduciário independente, semelhante ao modelo do Fundo Amazônia. Além disso, a legislação nacional deverá estar alinhada às necessidades do TFFF, que impõe a destinação mínima de 20% dos recursos para povos indígenas e comunidades locais, um aspecto que ainda não está explicitamente previsto na legislação brasileira.

Oportunidade de Escala

Se a regulamentação for adequada, a implementação do TFFF pode catalisar um programa público de PSA que atenda de maneira abrangente. Atualmente, as iniciativas de PSA no Brasil são fragmentadas e limitadas em alcance. Com a injeção de recursos bilionários e um fluxo anual previsível, será possível estabelecer uma política nacional que remunere desde grandes proprietários de terras até agricultores familiares, assentados e povos indígenas.

Experiências internacionais demonstram que programas públicos podem atingir uma escala significativa. O exemplo do programa chinês “Cropland to Forest Program”, iniciado no final dos anos 1990, é frequentemente mencionado. Esse programa converteu dezenas de milhões de hectares de áreas agrícolas em florestas, com pagamentos diretos aos agricultores, tornando-se o maior sistema de PSA do mundo. Esse caso sugere que, com estabilidade financeira e um arcabouço regulatório claro, o Brasil pode dar forma a um dos maiores programas públicos de PSA das Américas.

Pontos a Serem Regulamentados

A fim de absorver os recursos do TFFF com segurança jurídica e eficácia, especialistas recomendam avanços regulatórios sobre várias questões importantes.

O primeiro passo crucial é decidir se será criado um fundo fiduciário nacional de PSA, de natureza extraorçamentária, que proteja os valores do controle fiscal e assegure uma governança multissetorial. Sem essa estrutura, existe o risco de contingenciamento e perda de previsibilidade em relação aos recursos. Em paralelo, deve haver clareza quanto à natureza jurídica dos aportes internacionais, evitando disputas contábeis e questionamentos por parte de órgãos de controle.

Outro ponto sensível refere-se à definição de percentuais obrigatórios de destinação, em especial o mínimo de 20% para povos indígenas e comunidades locais, uma condição exigida pelo TFFF que visa aumentar a legitimidade social do programa. Para garantir credibilidade internacional, também são essenciais a implementação de regras de transparência e auditorias externas, com relatórios periódicos e verificações independentes. A integração com instrumentos já existentes, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e os sistemas de monitoramento do INPE, como Prodes e Deter, também é vital para assegurar rastreabilidade e consistência metodológica.

Adicionalmente, a regulamentação precisa envolver estados, municípios e a sociedade civil no processo de alocação de recursos, ampliando a legitimidade democrática e prevenindo uma excessiva centralização no governo federal. Outros elementos que podem fortalecer esta estrutura incluem mecanismos para evitar a dupla contagem com REDD+ e NDCs, critérios de priorização territorial, contratos plurianuais de PSA, instâncias de resolução de disputas e alinhamento com políticas fundiárias, todos fundamentais para a robustez e previsibilidade da implementação do TFFF.

Desafio Central

O TFFF é inovador ao combinar instrumentos do mercado financeiro com objetivos de conservação ambiental, porém, até agora, a nota conceitual do governo não detalhou como os aportes se transformarão em uma redução efetiva do desmatamento. O modelo oferece incentivos financeiros, mas a conversão desses recursos em ações concretas dependerá das políticas nacionais. Embora as promessas apresentem um potencial significativo, será necessário que elas sejam concretizadas na prática.

Para o Brasil, a regulamentação da Lei de PSA será fundamental na transformação dos fluxos internacionais em uma política pública estável, transparente e que produza impactos reais na conservação florestal. Sem esses ajustes, o país poderá receber grandes volumes de recursos, mas sem a capacidade de traduzir esses aportes em resultados adequados para a proteção ambiental.

As informações apresentadas neste artigo têm caráter educativo e informativo. Não constituem recomendação de compra, venda ou manutenção de ativos financeiros. O mercado de capitais envolve riscos e cada investidor deve avaliar cuidadosamente seus objetivos, perfil e tolerância ao risco antes de tomar decisões. Sempre consulte profissionais qualificados antes de realizar qualquer investimento.

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