Proposta abrange decisão do STF e supervisão parental.

by Fernanda Lima
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Plano do Governo Lula para Regular as Plataformas Digitais

O plano do governo Lula para regulamentar as plataformas digitais, que inclui dois projetos de lei a serem enviados ao Congresso nos próximos dias, incorpora a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a responsabilidade civil das empresas. O projeto prevê o controle parental em redes sociais e não aborda diretamente a questão da desinformação.

Responsabilidade das Plataformas Digitais

Em junho, o STF decidiu, durante o julgamento sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que as plataformas são obrigadas a remover proativamente conteúdos criminosos considerados graves, como terrorismo, incitação ao suicídio, discriminação, pornografia infantil, tráfico de pessoas e pedidos por golpe de Estado.

A responsabilização das plataformas ocorre em casos de falha sistêmica, ou seja, quando a plataforma não adota medidas adequadas para a prevenção ou remoção de conteúdos ilícitos, violando assim o dever de atuar de forma responsável, transparente e cautelosa.

Punições para Inadimplência

O texto do governo prevê a suspensão das atividades de empresas que descumprirem reiteradamente suas obrigações sistêmicas por 30 dias, podendo ser prorrogada por mais 30 dias. Essa penalidade seria aplicada somente após uma série de outras sanções—que incluem advertências e multas—e não estaria diretamente relacionada à remoção de conteúdo das redes sociais.

Medidas de Proteção Adicional

No Brasil, a suspensão de serviços pode ocorrer sem determinação judicial em diversas situações, como no Código de Defesa do Consumidor, por cassação de alvará pela prefeitura ou por decisão de agência reguladora. Contudo, o governo considera que é necessária uma medida de proteção adicional para redes sociais, dada a sua relevância para milhões de brasileiros. Assim, a proposta iguala o processo de suspensão de serviços digitais ao das concessões de rádio e televisão, evitando a suspensão direta sem ordem judicial.

Regulamentação Baseada em Decisão do STF

A intenção do governo é criar uma regulamentação fundamentada na decisão do Supremo, com algumas variações. O STF definiu que, enquanto o Congresso Nacional não aprovar uma nova lei, as plataformas serão responsabilizadas civilmente por danos resultantes de conteúdos gerados por terceiros em casos de crimes ou atos ilícitos, se não removerem o conteúdo após receber um pedido. A mesma regra se aplica a contas denunciadas como falsas.

O Palácio do Planalto acredita que as plataformas digitais não têm agido adequadamente para proteger os cidadãos, mesmo enquanto lucram com a atividade dos usuários.

Mudança de Cenário na Regulação

A discussão sobre a regulação parecia estagnada, até que o tema do abuso infantil emergiu após um vídeo viral do influenciador Felca denunciando pedófilos. O presidente Lula tem utilizado essa situação para reforçar a agenda de regulamentação.

Proteção de Crianças e Adolescentes

O projeto elaborado pelo Ministério da Justiça inclui uma seção específica dedicada à proteção de crianças e adolescentes, além de um foco em golpes e fraudes, que preocupam o governo por impactarem a economia popular.

O texto não aborda a desinformação e exclui crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria) do conjunto de conteúdos que podem ser removidos por notificação. No antigo PL das Fake News (PL 2630), a preocupação com uma possível “censura” nas redes sociais desgastou a proposta, algo que o governo Lula quer evitar.

Entre as medidas previstas, o projeto determina que contas de adolescentes com até 16 anos sejam vinculadas a contas de adultos responsáveis, conforme o PL 2628/2022, que trata da proteção de crianças e adolescentes no ambiente digital.

Regras para Redes Sociais

As redes sociais deverão impedir a criação de contas para crianças e adolescentes, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). As plataformas também precisarão criar mecanismos que possibilitem aos adultos responsáveis exercer controle parental, monitorando o uso da rede social pelos jovens.

Além disso, há uma proibição geral para a criação de contas próprias para crianças e adolescentes em serviços de intermediação de acomodações, locações, apostas, jogos online, conteúdo pornográfico e intermediação de acompanhantes.

Outros Pontos Previsto nos Projetos

A proposta do Ministério da Justiça é apresentada como um “Código de Defesa do Consumidor para usuários na internet.” O texto estabelece medidas de mitigação de riscos de acordo com o tipo de serviço digital oferecido e prioriza o direito do consumidor em vez de focar na punição às plataformas. Um dos principais objetivos é aumentar a transparência para os usuários de redes sociais, incluindo termos de uso e identificação de publicidade.

O projeto obriga as empresas a adotarem medidas proativas para remover conteúdos que representem crimes graves, como exploração sexual infantil, terrorismo e incitação ao suicídio. Em algumas situações, as companhias deverão retirar publicações mediante notificação extrajudicial, como no caso de publicidade enganosa ou abusiva.

Lógica Distinta da Proposta Anterior

A Sedigi buscou adotar uma abordagem diferente do PL 2630/2020 para evitar que a percepção fosse de que o governo Lula estava apenas reembalando a mesma proposta. O foco na proteção de crianças e adolescentes influenciou a elaboração da nova proposta, podendo ajudar a construir um consenso junto à oposição bolsonarista, que também é favorável ao tema.

Deveres dos Fornecedores de Serviços Digitais

Entre os deveres previstos para fornecedores de serviços digitais, conforme relato de pessoas envolvidas nas discussões, estão:

  • Instituição de SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente)
  • Canal de denúncias
  • Termos de uso
  • Combate a dark patterns (mecanismos de design que manipulam usuários)
  • Identificação de contas automatizadas
  • Proteção de dados
  • Restrição do autoplay em vídeos
  • Medidas de segurança e transparência

O anteprojeto também prevê a criação de repositórios de anúncios, a obrigação de combater abuso e exploração sexual infantil, além de mecanismos de avaliação de risco sistêmico, protocolos de crise e relatórios de transparência. Uma seção específica trata da garantia de direitos de crianças e adolescentes.

A proposta visa superar a visão de que as plataformas digitais são meras intermediárias. Para o governo, essas empresas são fornecedoras e devem ser responsabilizadas caso não mitiguem os riscos associados aos seus serviços. Os elaboradores afirmam ter utilizado a mesma lógica do Código de Defesa do Consumidor e do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Foco Econômico e Concorrencial

Por outro lado, o projeto elaborado pela Fazenda foca no mercado das plataformas de redes sociais e aborda aspectos econômicos e concorrenciais. O texto aumenta o poder do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para investigar e estabelecer novas obrigações às empresas, buscando combater possíveis monopólios na oferta de serviços, anúncios e buscas, além de outras formas de abuso de poder.

Segundo o texto em discussão, o Cade terá a atribuição de classificar empresas como “sistemicamente relevantes,” considerando critérios como poder de mercado, acesso a grandes volumes de dados pessoais e comerciais, faturamento e número significativo de usuários.

A Fazenda observa que vários países têm obtido êxito ao estabelecer jurisdições específicas para atualizar a legislação concorrencial e implementar novas ferramentas regulatórias pró-competitivas, citando como modelo o European Digital Markets Act (DMA).

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